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02
Jan08

Autógrafos - Ascêncio de Freitas

blogdaruanove

 

Ascêncio de Freitas (n. 1926), Cães da Mesma Ninhada (1960).

Capa de Garizo do Carmo (n. 1927).

 

 

Ascêncio de Freitas (n. 1926). 

   Cães da Mesma Ninhada foi o volume de estreia de Ascêncio de Freitas. Aí anunciava-se já a preparação do livro de contos Fronteira do Inferno e do romance Da Terra Crescem Raízes, obras que não chegaram a surgir com esses títulos. Aliás, o autor apenas voltou a publicar na segunda metade da década de 1970, quando surgiram os volumes À Boca do Passado (1977?), Ontem Era a Madrugada (1978) e E a Raiva Passa por Cima, Fica Engrossar um Silêncio (1979).

   Posteriormente, publicou ainda Boca do Passado (1981), Crónica de Dom António Segundo (1983) e na década seguinte Carmen Era o Nome (1996) e Na Outra Margem da Guerra (1999). Já neste século,  surgiram O Canto da Sangardata (2000), Mentiras, Elefantes e Etcétera: Estórias de Caça em África (2000), A Reconquista de Olivença (2001), Estória do Homem que Comeu a Sua Morte e Outros Contos (2002) e A Paz Enfurecida (2003). 

   Tendo chegado a Moçambique em 1949, Ascêncio de Freitas foi desde o início da sua colaboração em jornais e revistas literárias classificado como um autor moçambicano. No entanto, a acção da maioria dos contos de Cães da Mesma Ninhada, volume premiado pelo Centro de Cultura e Arte  da Beira, em Moçambique, decorre essencialmente nas regiões costeiras da Estremadura e Beira Litoral. Apenas o último conto, "Uma Casa na Serra", apresenta um espaço de acção moçambicano.

   Do conto "Linhas de Rumo", transcrevem-se alguns parágrafos:

 

   "Excitado, levou o copo à boca e emborcou-o. Marçalo inclinou-se sobre a mesa e pousou a mão aberta sobre a toalha.

   – Olhe! Quer ouvir uma coisa que eu lhe digo? O padre da minha freguesia é um tipo teso de verdade.

   O sargento riu-se:

   – Qual o quê. Ó rapazinho! Havia de os ver quando eles andaram metidos com os trauliteiros. Pareciam coelhos quando a gente chegava.

   Marçalo virou a cara e ia protestar quando a porta se abriu e entrou um sujeito muito bem vestido e de chapéu na cabeça. Atrás dele entrou outro do mesmo tipo: logo em seguida entraram mais dois, fardados e de cassetete na mão.

   A sua entrada fez calar o padre que discursava e todos olharam ao mesmo tempo para a porta. Mas de repente o padre recompôs-se e recomeçou o discurso como se não tivesse entrado ninguém na sala.

   Marçalo sentiu um arrepio a percorrer-lhe os ossos. O sargento ficou de boca aberta e de copo na mão.

   O padre falava com segurança sem olhar para os outros que tinham entrado. A sua veemência assustava Marçalo. E o sargento começou a murmurar surdamente, entre dentes:

   – Sim senhor!... Sim senhor!...

   Os dois homens bem vestidos dirigiram-se para o padre. Vários homens se levantaram. Entre eles, Marçalo viu Ramalho e o homenzinho baixo. Depois viu Ramalho afastar a cadeira e colocar-se diante dos dois homens. Ficou espantado com o que se passava com a cara do outro: estava pálido e tinha aquela expressão que o fazia temer quando eram garotos e andavam os dois na escola.

   O padre continuava a falar.

   Os dois homens interpelavam Ramalho e ele abanava a cabeça, numa negativa segura e calma. De repente um quis dirigir-se para o padre e ele pôs-lhe a mão aberta diante do peito; depois abriu a mão sobre o  peito do outro fechando-lhes a passagem. Começou a empurrá-los, brandamente...

   Um dos polícias adiantou-se e Marçalo sentiu uma angústia gelada cair dentro de si. Viu o outro vibrar uma pancada forte com o cassetete num dos braços do amigo, que caiu inerte, ao longo do corpo. Depois atirou-lhe nova pancada que lhe apanhou um lado da cabeça.

   Marçalo olhou os outros, rígidos, em fila: as caras sem expressão, como se fossem de cera. O raciocínio não lhe dizia nada e sentia no corpo uma onda enorme de medo, que o sufocava. Ramalho ficara quieto, com os braços caídos e aquela máscara branca e dura a fechar-lhe o rosto. O padre deixara de falar e olhava a cena com os olhos muitos sérios.

   Marçalo, sem saber porquê, curvou-se para o sargento e perguntou-lhe as horas: o outro não desfitou o grupo formado por Ramalho e os três polícias, e não respondeu."

 

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