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Jan08

Ultimato, Literatura e Regicídio

blogdaruanove

Guerra Junqueiro (1850-1923), bilhete postal do início da década de 1910, editado por Rocha, Lisboa.

 

   O Ultimato que a Inglaterra apresentou a Portugal em Janeiro de 1890 marcou indelevelmente o período que se seguiu à aclamação de D. Carlos I (1863-1908; rei, 1889-1908), surgindo como um presságio de todas as dificuldades que iriam marcar o seu reinado.

   Numerosos intelectuais e artistas manifestaram o seu desagrado perante a actuação do governo português ao longo desta crise e dos momentos que se seguiram. Alfredo Keil (1850-1907) e Henrique Lopes de Mendonça (1856-1931) compuseram logo nesse ano o hino A Portuguesa, que haveria de se tornar o hino nacional após 1910. Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905) iniciou a produção das suas famosas cerâmicas anti-britânicas, no seguimento das caricaturas de sua autoria que já vinham abordando a situação colonial em África desde há alguns anos.

   Guerra Junqueiro (1850-1923) publicou também nesse ano Finis Patriae, um livro cujo título encerra um manifesto em si mesmo. Aí se incluía o fragmento À Inglaterra, um texto escatologicamente frontal, composto logo em Fevereiro de 1890. As duas primeiras estrofes são suficientemente eloquentes sobre o tom do poema:

 

"Ó cínica Inglaterra, ó bêbeda impudente,

Que tens levado, tu, ao negro e à escravidão?

Chitas e hipocrisia, evangelho e aguardente,

Repartindo por todo o escuro continente

A mortalha de Cristo em tangas d'algodão.

 

Vendes o amor ao metro e a caridade às jardas,

E trocas o teu Deus a borracha e marfim,

Reduzindo-lhe o lenho a cronhas [sic] d'espingardas,

Convertendo-lhe o corpo em pólvora e bombardas,

Transformando-lhe o sangue em águarrás e gim!"

 

 

 

   Três anos depois, Delfim Guimarães (1872-1933) publicou Confidências (1894), um livro onde perpassa ainda o sentimento anti-britânico mas onde se apontam essencialmente as debilidades que dilaceravam a sociedade portuguesa. Os extractos dos sonetos que a seguir se transcrevem deixam bem clara a situação deplorável em que o país se encontrava:

 

"SEM PÁTRIA

 

I

 

Se tu voltar puderas, meu poeta,

A contemplar a pátria decantada,

Havias de encontrá-la bem mudada.

De nobre que já foi tornou-se abjecta.

 

(...)

 

O pavilhão das quinas não batalha;

Faz hoje em dia o papel de toalha

Nas mesas avinhadas dos bretões...

 

(...)

 

 

V

 

O meu torrão natal!... Campos sem trigo...

Aldeias sem ninguém, despovoadas...

Tudo some o Brasil. Pelas estradas

Quantos entes sem pão, quanto mendigo!

 

(...)

 

VI

 

Aumenta a emigração! Barcos ingleses

Saem a barra em busca do Brasil,

Levando a bordo, aos cem, aos mil e mil

De robustos rapazes portugueses.

 

(...)

 

X

 

(...)

 

Desditoso país! Que vilipêndio!

Quanto melhor não fora que um incêndio,

Um pavoroso incêndio te arrasasse!...

 

Ó torpeza sem nome, ó vil torpeza!

A pátria de Camões, colónia inglesa,

A pátria de Camões, casa de passe!"

 

   Considerando que entretanto, a 31 de Janeiro de 1891, ocorrera a revolta republicana do Porto, considerando que em meados dessa década se travavam em África, particularmente em Moçambique, combates para controlar revoltas nos territórios sob administração portuguesa, considerando que a situação económica e financeira do pais se deteriorou gravemente no início do século XX, considerando que a emigração legal atingiu o seu máximo nos primeiros anos desse século, considerando a ditadura de João Franco (1855-1929), a censura à imprensa e todo o desencanto vivido nesse início de século, torna-se evidente que a teoria da conspiração, cuidadosamente preparada e organizada e com vastos apoios, para assassinar D. Carlos I se apresenta como perfeitamente plausível e lógica. Aliás, o simbolismo da própria data do regicídio não seria alheio a uma evocação revanchista do insucesso da revolta do Porto.

 

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