Macau, 1936 (VII)
Ele voltara às leituras. Um mundo de sonho, só seu, onde era personagem de histórias que outros tinham sugerido. Lia agora um conjunto de pequenos textos sobre Macau, a China e o velho Wenceslau, publicado três anos antes. Demorou-se na leitura de uma página em particular... "O ópio de Macau tem fama, é muito apreciado, havendo um técnico especialmente encarregado de prová-lo antes de sair da fábrica. A operação de fumar o ópio é muito mais complicada do que a de fumar tabaco, pois que além de um cachimbo especial, requer ainda vários utensílios entre os quais figura a indispensável lamparina do ópio." Sorriu, imaginando o estado do técnico provador... Imaginou-se provador, imaginando Boubouka como preciosa gota leitosa de afyan... Caíu em si. Haviam-se passado semanas. Tinha que resolver a questão da sua passagem para Macau.
Não se apercebera que tinham passado tantas semanas. Em breve, o Sibajak efectuaria nova viagem para o sudeste asiático. Não hesitou. Desistiu da passagem aérea. Revalidou a passagem no navio. Disse a Boubouka que partiria em breve. A resposta dela foi o mais triste dos sorrisos que ele havia visto. Ao fim da tarde, Boubouka desistiu de se conter. Era um olhar sussurrante, o seu. "Não me deixes..." pediu ela, sem quase mover os lábios. Ele olhou-a, como se nunca tivesse olhado para ela. O espaço entre aqueles olhares era uma tristeza imensa. "Nunca te deixarei", prometeu ele. Tremia, quando o disse. Tremiam os dois quando se abraçaram.
Ele compreendera que nunca mais amaria ninguém como amava Boubouka. Os dias tornaram-se numa longa e insuportável angústia. As noites passaram a ser contínuos pesadelos, em que um monstruoso Sibajak o engolia a ele, Jonas.

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